Foto: Pedro França/Agência Senado
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) deve tornar-se uma política pública permanente e a participação do governo federal no financiamento deve aumentar significativamente. Estes foram os pontos destacados pelo consultor legislativo Paulo de Sena Martins na Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE), na primeira audiência pública sobre a renovação do Fundeb, realizada nesta terça-feira (21), cujo prazo de validade termina em dezembro de 2020.
Martins atua na Câmara dos Deputados e, desde 2015, tem auxiliado a deputada Dorinha Seabra Resende (DEM-TO), relatora da proposta de emenda à Constituição que tenta tornar o Fundeb permanente (PEC 15/2015). Ele destacou que nos dois últimos anos a comissão especial realizou dezenas de audiências, com alguns consensos já produzidos.
— Já consultamos e nos reunimos com praticamente todos os setores envolvidos na educação brasileira, desde autoridades nos três níveis da administração aos mais significativos representantes na academia e na sociedade civil. Todos veem como primordial que o Fundeb deixe de ser uma política temporária e entre definitivamente na Constituição, e que o governo invista mais. Hoje a União entra com 10% dos recursos. O substitutivo da deputada Dorinha Seabra aumenta a princípio esta participação para 15%, aumentando 1,5% a cada ano, até chegar a um teto de 30%. Todas as forças políticas na Câmara também convergem nestes pontos de vista, embora a proposta esteja, claro, ainda totalmente aberta a emendas e negociações — detalhou o consultor.
No Senado, as PECs 33/2019, de Jorge Kajuru (PSB-GO) e 65/2019, de Randolfe Rodrigues (Rede-AP), também têm o objetivo de tornar o Fundeb permanente.
Mais recursos para a educação
Para Martins, o país só terá a ganhar com a efetivação do Fundeb. Doutor em Educação pela Universidade de Brasília (Unb), lembrou que também fez parte de grupos de trabalho na década de 1990 quando da implantação do Fundef (Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental), na prática o precursor do Fundeb, que foi estabelecido em 2006.
— Antes do Fundef, em muitos estados, nem mesmo um salário mínimo era pago a professores da educação básica. Esta era uma situação muito comum. Foi a partir do Fundef que a gente conseguiu pelo menos nacionalizar o salário mínimo para estes professores. E passaram também a haver políticas indutivas de aprimoramento dos programas da área. E com o Fundeb, foi dado o passo além, também na melhoria dos programas, e estendendo para toda a educação básica. Os programas suplementares são de responsabilidade do governo federal e deixaram de ser focados só no ensino fundamental — disse.
O senador Flavio Arns (Rede-PR), que é relator da PEC 65/2019, afirmou ser favorável à retomada da taxação sobre lucros e dividendos das empresas, como uma futura fonte de financiamento para o Fundeb permanente. Lembrou que esta desoneração, que é praticada pelo Estado brasileiro desde 1995, atualmente lesa os cofres públicos em cerca de R$ 120 bilhões por ano.
— Lucros e dividendos para acionistas não pagam Imposto de Renda neste país. Uma pessoa pode ganhar R$ 5 mil por mês numa empresa e retirar outros R$ 300 mil como divisão de lucros, que não será taxada na pessoa física. Há uma desoneração para acionistas e diretores, uma tremenda injustiça tributária. Estamos negociando para incrementar os repasses federais no âmbito do Fundeb em mais R$ 15 bilhões, a partir do fim desta desoneração — disse Arns.
Zenaide Maia (Pros-RN) também deixou claro seu apoio à diretriz apontada por Arns. Considera “um absurdo” que cerca de 19 mil grandes acionistas de empresas no Brasil, com faturamentos superiores a R$ 300 mil por mês, não paguem Imposto de Renda, enquanto assalariados com vencimentos superiores a R$ 5 mil arquem com tributos equivalentes a 27% de seus salários.
Por fim, Martins disse que a comissão especial do Fundeb na Câmara também estuda vincular as arrecadações provenientes do setor petrolífero ao Fundeb. Mostrou um gráfico da própria Agência Nacional do Petróleo (ANP) indicando que estas arrecadações devem atingir R$ 6 trilhões até 2054, estabelecendo portanto uma média de R$ 167 bilhões anualmente até lá.
Alertas do consultor
Martins ainda contestou análises difundidas hoje publicamente de que o Brasil já investiria em educação em níveis comparáveis aos das nações desenvolvidas, e que o problema, portanto, seria de gestão. Mostrou que o gasto per capita do país em educação ainda está muito distante ao que é praticado nas nações que fazem parte da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), também conhecida como o “clube dos ricos”.
— O que conta nas avaliações internacionais que são levadas a sério é o gasto per capita, não uma comparação no que tange ao produto interno bruto [PIB] de forma isolada, sem levar em conta nem sequer o poder de compra. A própria OCDE e outras organizações levam em conta nas suas avaliações, o valor aplicado por aluno. E nestas comparações o Brasil está muito abaixo. Na faixa entre 6 a 15 anos de idade, investimos menos que a média da América Latina. Dá cerca de U$ 3,7 mil por ano, enquanto entre as 40 nações da OCDE este investimento gira em torno de U$ 8,63 mil — alertou.
Martins também não recomenda retirar recursos do ensino superior e redirecioná-los à educação básica. Mostrou que também no ensino superior, o Brasil hoje investe pouco, cerca de 0,9% do PIB, quatro vezes a menos do que é investido na educação básica. Um redirecionamento desses recursos, retirando a União da manutenção do ensino superior, a seu ver, vai agravar os problemas da educação em vez de melhorá-los.
Pontos finais
Ainda durante o debate, o senador Zequinha Marinho (PSC-PA) pediu que o novo Fundeb aumente os repasses da União para os estados do Norte e do Nordeste. Ele também acha que o fundo precisa criar incentivos baseados em bons desempenhos verificados em algumas regiões e escolas específicas. Por fim, Martins também recomendou que o governo precisa preocupar-se em tornar as carreiras do magistério mais valorizadas e atrativas, visando conseguir que profissionais de grande qualidade também dediquem-se à docência.
Hoje, o Fundeb administra recursos equivalentes a cerca de R$ 156 bilhões por ano, com quase 90% deste montante advindo de estados e municípios.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)